Mário Louro
Enólogo desde quase sempre, foi cedo que herdou a arte de seu pai.
Em 1976 passou a desempenhar funções na Câmara de Provadores passando a ser membro do júri de concursos nacionais e internacionais, como o Concurso Mundial de Vinhos (1979) e MUNDUS VINI (Alemanha).
Da elaboração dos programas de rotas de Vinho para a Expo 98, à coordenação do Projecto para o Conhecimento dos Vinhos Portugueses na Ásia, muitas foram as actividades no mundo dos vinhos ao longo dos anos.
Formador para profissionais desde 1991 e para enófilos desde 2000, destaca-se como formador da disciplina de Enologia na Escola Hoteleira do Estoril e Lisboa.
É ainda desde 2007 Director do Concurso Nacional de Vinhos, onde em 2012 estiveram presentes 198 provadores nacionais e estrangeiros.
Escreveu dois livros: “Quinta da Lapa” e “Uma Historia de Vinho”, e é actualmente cronista regular para vários jornais e revistas.
HISTÓRIAS À VOLTA DO VINHO | Vinho de Collares

O Viticultor de Collares guia-se em geral pela sua prática, desprezando todos os processos modernos e desconhecendo todos os fenómenos da fermentação.
Esta região, foi criada por carta de lei de 18 de Setembro de 1908 e para todos os efeitos legais, são considerados vinhos de pasto de tipo regional, os que a tradição firmou com as designações usuais de COLLARES.

Há dias, passeando-me pelo facebook, dei por mim a intervir numa discussão do porquê de um Vinho de Colares ter num rótulo antigo dos finais do séc. XIX a designação de Collares. Esse rótulo do ano 1883, julgo, só mencionava a marca de um restaurante que o comercializava e nem citava o engarrafador.

Após aturada pesquisa verifiquei que só quatro produtores poderiam ser citados como possíveis engarrafadores, pois foram os únicos que participaram na Exposição Agrícola de Lisboa em 1884, e que naquele ano solicitaram exame analítico ao seu vinho.
Refiro-me a António Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Cristovam d´Almeida Guimarães, Manuel Simões Ferreira  e Viúva de José Gomes da Silva.

Desta discussão sai este meu artigo.

A designação Collares, tal como Bucellas, foram as designações citadas pela carta de lei de 1908 e tristemente alteradas por decretos ortográficos que já na altura venciam a tradição. E é no Acordo Ortográfico Luso-Brasileiro de 1931 que sofre as grandes alterações,  apesar  da  Academia de Ciências de Lisboa não ter acatado integralmente, no que diz respeito às consoantes mudas.

Nos anos 1930 a designação já tinha sido alterada e o próprio relatório de contas da região, de 1931 a 1937, a Edição da Adega Regional de Colares - Vinho de Colares 1938,  ou a Região de Colares do Engenheiro Henrique de Barros de 1938, nunca citam a expressão Collares.
Mas em todos os livros que procurei da minha biblioteca pessoal - “Memórias da Agricultura de 1787 e 1788", "Conferências sobre vinhos por António Augusto de Aguiar de 1876", "Tecnologia Rural de Ferreira Lapa 1885", "Vinhos de Pasto de Batalha Reis 1894", "Congresso Vitícola Nacional de 1895", "O Portugal Vinicola de Cincinnato da Costa 1900", "O Vinho de Collares de Antonio R. A. Cunha 1910" e "Vinificação Moderna de Pedro Bravo de 1926", verifico que em todos é  sempre designada por REGIÃO DE COLLARES.

Aqui está para mim, a motivação desta Denominação, os acordos ortográficos podem ser cumpridos, agora em termos de marca a expressão COLLARES  tem mais força e acredito que podia ser uma ajuda à Região, dada a mesma ser uma das primeiras denominações dos vinhos Portugueses e  ter uma divulgação menor por parte das Entidades que tanto ou tão pouco tem feito por esta Denominação.

Recordo ainda que uma marca do Século XX, Manuel José Collares(MJC) também ela usava a mesma ortografia. 

As minhas outras motivações estão associadas em primeiro lugar ao meu Pai, Regente Agrícola que em 1938 estagiou na Adega Regional. Eu durante anos provei vinhos de 1933, garrafas de meio litro, só com etiqueta perto do gargalo e aprendi a reconhecer que o período de envelhecimento daquele vinho em nada o tinha prejudicado, bem antes pelo contrário, após 50 anos, apesar das cores de cebola acentuadas, dos aromas com notas muito evolutivas,  apresentavam bouquets e índices de taninos muito elevados.

E é com isto que volto aos vinhos  dos produtores citados, pois são dois factores me pareceram importantes, e que para a maioria dos leigos não têm qualquer significado: o tom da cor, também dito o grau de abrimento da cor, e os taninos.

Todos aqueles produtores apresentam nas suas análises estes elementos, e na maioria o tom da cor diz-se cravo aberto, isto já nos vinhos de 1883 e colheitas seguintes, e os índices elevados dos taninos da região.

As razões, é que no primeiro caso todos os vinhos tinham longos períodos de estágio e envelhecimento donde resultava um descasque enorme no tom da cor e no grau de abrimento da cor, com valores muito baixos, variando entre 2,65 e os 3,50.

No segundo caso os taninos. Pela casta Ramisco a única de Colares, e a que tem a graínha mais pequena das castas portuguesas, versus o tamanho do bago, pelos processos de vinificação, nunca terem sido a preocupação da Adega Regional, na altura sem desengace, e pelos longos períodos de pisa e vinhos prensados em prensa contínua, no sentido da extracção, a acidez e os taninos eram sempre muito elevados e quase insuportáveis para o consumo imediato.
Daí longos períodos de estágio e  envelhecimento.

O interessante, é que nos dias de hoje, os nossos enólogos esquecem muitas vezes os índices de taninos que dão suporte ao índice de souplesse de cada vinho.

Mário Louro

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